24/04/2012
Parceria Para o Século XXI
Rubens Antonio Barbosa

A recente visita da presidente Dilma Roussef a Washington foi mais um passo (discreto) na difícil construção de uma agenda positiva que conecte os interesses do Brasil e dos EUA e faça ampliar nossa cooperação bilateral.

Na visita de Obama a Brasília, em marco de 2011, foram lançadas as bases de um trabalho conjunto para os próximos anos, o que implicará na gradual diferenciação do Brasil pelos EUA no contexto latino-americano.

Dando seguimento a esse processo, o Governo brasileiro levou para o encontro de Washington uma agenda clara, embora pouco ambiciosa, para o presente momento das relações com os EUA. A principal prioridade foi a busca de parcerias na área de inovação, responsável, em grande parte, pela recuperação da economia norte-americana. Nos encontros oficiais e empresariais, foi dada grande ênfase à busca de diferentes formas de cooperação nas áreas de educação e ciência e tecnologia.

Nesse contexto, o lado brasileiro ressaltou o interesse em contar com o apoio de universidades norte-americanas para o programa Ciência Sem Fronteiras, tal como discutido nos encontros em Boston, com a direção do MIT e da Universidade de Harvard, em Boston.

Nas reuniões empresariais foram examinadas essas e outras áreas (energia fóssil/renovável, espaço) onde os investimentos de empresas dos EUA no Brasil poderiam ser ampliados. Em vários momentos, entretanto, a política de conteúdo nacional, importante para fortalecer a indústria nacional em setores críticos para o Brasil, foi questionada como empecilho para a ampliação dos investimentos.

Embora na área de aviação continuem pendentes licitações para a compra, pelo Pentágono, de aviões da Embraer e, pelo governo brasileiro, dos caças, formalizou-se acordo de cooperação na área de negócios que deverá beneficiar a Embraer e a Boeing.

O que seria difícil imaginar alguns anos atrás, o diálogo de defesa foi expandido e haverá reunião no Brasil nesta semana com a presença do Secretário da Defesa Leon Panetta, No encontro entre Dilma e Obama, segundo transpirou das conversas na Casa Branca, ao examinar a evolução da crise da economia global, foram reiteradas as preocupações brasileiras com relação às politicas monetárias expansionistas adotadas nos EUA e na Europa, acarretando a depreciação do yuan e do dólar, e seu efeito negativo sobre o crescimento dos países em desenvolvimento. A resposta pública de Washington veio por meio de declaração da Diretora Gerente do FMI, Christine Lagarde, contestando a afirmação de Dilma. Quanto à política externa, foram reiteradas as posições em relação a Síria (apoio às propostas de Kofi Anan para o cessar fogo e respeito aos direitos humanos), ao Irã (preocupação com a escalada retórica e a necessidade de se encontrar uma solução pacifica para a questão do programa nuclear iraniano), a Cuba (fim do embargo) e quanto à reforma do Conselho de Segurança da ONU (pretensão do Brasil por assento permanente).

A posição cautelosa das autoridades de Washington não chega a surpreender pela inibição derivada das dificuldades econômicas e pelo foco na politica interna com a aproximação das eleições presidenciais. “Foi como falar para uma parede”, ouvi de alto funcionário brasileiro. É possível prever, contudo, que, caso vença a eleição e consiga maioria nas duas Casas do Congresso - o que hoje parece pouco provável - Obama adote no segundo mandato uma atitude diferente naqueles temas,.

Contrastando com a limitada cobertura na mídia local sobre a visita presidencial (comparada com as visitas dos chefes de governo da China, Índia ou da Rússia), foi positiva a reação nos setores empresarial e acadêmico. Despertou interesse a visão pró-ativa na busca de investimentos em inovação e no envio de cerca de 20.000 estudantes para os EUA, parte dos 100.000 previstos no programa Ciência sem Fronteiras. E o encontro da presidente com intelectuais e formadores de opinião lançou sementes para o melhor entendimento a respeito do novo papel do Brasil no mundo.

Nesse particular, não poderia ter sido mais inadequado, ao final da visita, o anúncio, de decisão burocrática menor, relativo à classificação da cachaça no mercado americano. Na superficial cobertura da visita presidencial pela imprensa internacional, a cachaça virou a notícia mais importante e, em alguns casos, a única. Para um país que pretende ocupar crescente papel no cenário internacional e ter sua voz ouvida, temos muito que aprender sobre comunicação e briefings, antes e depois das visitas presidenciais.

A presidente Dilma, de público, varias vezes sublinhou o interesse brasileiro em estreitar e aprofundar a "importante relação" com os EUA na base do respeito mútuo e do "diálogo entre iguais". E disse saber da relevância do desenvolvimento de uma parceria com os EUA no século XXI. Mais específico, o ministro Fernando Pimentel ressaltou ser a relação com a China apenas comercial, enquanto que, com os EUA, era mais abrangente e diversificada. Hillary Clinton qualificou o Brasil como “responsável”, fazendo clara distinção em relação à alguns vizinhos e a outros países em desenvolvimento.

A mudança de tom e de ênfases nas relações com os EUA parece, sem duvida, a principal evolução na política externa brasileira se comparada com os oito anos anteriores. A atitude ideológica foi substituída pela visão pragmática que poderá trazer resultados positivos para o Brasil.

Resta saber se os dois países saberão conectar, oficial e empresarialmente, os interesses recíprocos para efetivamente desenvolver uma parceria para o século XXI, reconhecendo que os EUA não vão perder a posição de liderança no mundo e que eles dispõem de conhecimentos tecnológicos que poderão, por nós, ser absorvidos com vantagem.

Rubens Barbosa, Presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp

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